quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Fétiche

"Beba!". Assim disse Lucinda, após entregar meio copo de vinho ao teu suposto amado. Tivera enganado a todos, e até a si mesma. Não amava Cabral da maneira que tal homem merecia. Ele merecia mais. Ela queria mais. Mais dinheiro, mais bens, mais prazer.
*

Por este motivo, Lucinda foi até aquela velha cabana de palha por entre os matos encontrar a temida Srª Temilda, que por obra do acaso, talvez, nunca tornou-se senhora, por nunca ter chegado a realizar o ato conjugal. Depressiva, assim, arranjou-se com um gato. Gato este que se chamava Breu. Branco como as nuvens em dias de domingo. Talvez até fosse um pedaço delas, de tão doce que era.
*

Voltando para Lucinda...
Fez juz ao teu nome, que provinha d'outro chamado Lúcifer. Encomendou uma dose do mais poderoso veneno. O mais vendido. Sem gosto algum.
*

No outro dia, de manhã cedinho, logo quando o Sol apareceu, lá estava Lucinda caminhando pelos matos novamente. Disse a Cabral que iria na casa da amiga, ao lado. Ao chegar frente à tenda da temida Temilda, foi logo entrando, sem nem bater. A casa escura, como sempre. Mas, só quem ela conseguiu encontrar nos aposentos foi o gatinho Breu, descansando sobre o sofá. Na mesinha de centro um pequeno bilhete com letras garrafais e um potinho de vidro ao lado. Abriu o bilhete e logo leu:
"FUI À FEIRA. EIS O TEU VENENO. 3 GOTAS APENAS. DEIXE O DINHEIRO NA GAVETA ABAIXO.
T."
Guardou-os no bolso e foi correndo pra casa.
*

Entrou na cozinha ofegante. Preparou as duas taças de vinho. Uma com veneno e outra sem. Depois, foi banhar-se para assistir à morte do marido. Chegando ao quarto, Cabral viu que Lucinda se banhava, e para não atrapalhar, foi procurar seu relógio de bolso por si só - já que muitas foram as vezes em que acabara misturando suas coisas com as da mulher. Remexeu gavetas, armários, cômodas. Até debaixo da cama, e nada! Viu a roupa - que Lucinda usara para sair - em cima da cama. "Lucinda, danada...usando o meu relógio outra vez?" Foi neste exato momento que acabou encontrando o bilhete juntamente com o pote de vidro. Leu. Já havia percebido que sua mulher agia estranhamente. Não correspondia ao seu amor. E por ter dinheiro aos montes, chegou a uma única conclusão. Ela queria a sua fortuna. "Oh, Lucinda. Como pode ter feito isso comigo?" Traído, pegou o pote e o bilhete, desceu até a cozinha, viu as taças que os esperavam e pingou 3 gotas em cada.
*

Antes que Lucinda terminasse o banho, subiu às pressas e pôs tudo no mesmo local. Do jeitinho que estava. Desceu novamente, deitou na sua poltrona.
Passados uns 10 minutos, desce uma dama vestida de vermelho. Vestido longo e decotado, com um cigarro à mão direita. "Acompanhe-me, Cabral. Hoje é um dia muito epecial." Assim fez. E chegando à cozinha, sentiu-se num palco teatral, onde ele era o ator principal. "Como assim um dia especial, doce Lucinda?". Em resposta ela disse: "A data do nosso primeiro beijo!". Cabral já estava a ponto de explodir em mil pedaços. "Beba!", continuou. "Ao nosso amor."
*

Agora lá estavam os dois. Um frente ao outro, brindando. Beberam todo o vinho que na taça estava. Sentiram-se tontos. A vista turva. Cairam. Ambos sentados no chão. O coração batia mais lentamente. Cabral abriu a boca, já seca, e por ter tomado a taça com apenas 3 gotas, conseguiu dizer suas últimas palavras:
"Tu mereces por ganância.
Eu mereço por amor."
*

30 minutos depois, Cabral e Lucinda eram apenas dois corpos estendidos no chão.

2 comentários: